Childhood Spaces
encolhido entre móveis, ria-me
tocava no brilho dos metais dourados
trincava a talha, bulia nas sombras
e via, via um fumo azul que entranhava nos poros da minha pele
descascava com as unhas lâminas de madeira acetinada
desenhava manchas de reflexos
cortinas negras pendiam, cortinas de luz resvalavam no chão
fitas de bronze emolduravam as transparências
por vezes encontrava pedaços de sono esquecidos nos armários
espreitava-os por dentro embriagado de curiosidade
inspirava o cheiro da escuridão
sentava-me debaixo das cadeiras altas
adormecia debaixo das camas, arranhava o pó
enclausurava-me num tríptico de espelhos e desvendava
desvendava espaços recônditos, desmantelava caixas de cartão
tecia recantos, abrigava-me do vento, quieto, da chuva seca
a atmosfera cálida sugava a nitidez das sombras
enobrecia os objectos, seduzia-me para me deitar entre eles
pingos de humidade deslizavam pelas paredes
estalidos salpicavam o silêncio
e parecia que via pianos pairar acima de mim
caixinhas de música cintilavam sons